Entre o Cèu e o Bonsai Primeiro Capitulo

A iluminada e ensolarada cidade de Los Angeles tem aproximadamente 4 milhões de habitantes e é a maior cidade da Califórnia com um clima seco e muito quente no verão. Nossos olhos se perdem na cidade com suas imensas e largas avenidas com grande fluxo de turistas por ela ser de fácil locomoção. Apesar de L.A ter sido uma cidade planejada para carros, hoje depois de muitas campanhas incentivando a população a andar a pé e de bicicleta, se transformou numa cidade com o melhor e mais eficiente sistema de ônibus do mundo. Pode-se circular por toda a cidade e encontrar as mais caras e sofisticadas casas de moda, mas é em Rodeo Drive um centro de compras que se encontram as mais famosas lojas e joalherias como joalheirias Tiffany & Co, Louis Vuitton, Dolce & Gabbana, Gianfranco Ferre, Gucci, entre tantas outras. Circular em los Angeles e ver tanto luxo e industria do cinema além de ser um lugar de moradia e circulação das mais importantes celebridades do mundo é difícil imaginar num primeiro olhar que Los Angeles tenha um bairro pobre ou problemas sociais, mas existe e um dos mais problemáticos é o bairro de Northeastern Watts que é grande e movimentado e se localiza ao sul da cidade e fica entre outros bairros também conhecidos como sendo violentos e pobres. O local já foi muito difícil de ser freqüentado principalmente nos anos 70, quando era dominado por gangues de rua como os mais conhecidos Crips e os Bloods que aumentaram o índice de violência. Entre 1989 e 2005, a polícia ainda registrou mais de 500 homicídios, Mesmo tendo sido assinado um tratado de paz em 1992 o bairro só mudou sua situação e passou a ser mais bem freqüentado depois que a população negra que foi praticamente a maioria nos anos 80, foi um pouco substituída por outros imigrantes. Com a paz e a mistura de raças, hoje Watts é bem mais tranqüila de se viver e circular, mas ainda existem muitos problemas.

Keanu Reeves acordou com o seu celular tocando. Sentindo que dormiu muito, era acostumado a acordar cedo para cumprir seus compromissos diários. Sentiu sua respiração lenta, bocejou e esticou seus braços para espreguiçar e acordar e aproveitou para alcançar o celular do seu lado em cima da cama, viu que era seu advogado Robert e atendeu.

-Hi...good morning Robert
-Good morning Keanu, temos um compromisso hoje você lembra?
- SIM, temos mais alguma coisa?
- Não, é só este, eu marquei para as 17 horas porque tenho outros compromissos e só este horário me é possível, tudo bem?
- Por mim tudo bem!

Será hoje a entrega dos cheques administrativos a Ong ‘ Mãos solidárias’ que eles vem ajudando há alguns anos, eles estavam abrindo um novo abrigo sob a responsabilidade do velho Steve e um novo pastor brasileiro. Sendo que o encontro para a entrega dos cheques será com a sobrinha do pastor que acabara de chegar do Brasil. Keanu já sabia que o velho Steve nunca se ausentava de suas obrigações para fazer algo burocrático. Levantou com vontade para resolver algumas pendências na empresa de filmes pois teria o dia inteiro livre, até a hora da reunião. Ligou o chuveiro para um banho quente e coçou os cabelos. Não tinha nada para pensar que não fosse trabalho, se olhou no espelho e continuou se observando enquanto escovava os dentes, gostava deste momento do dia, pois era sempre um novo dia um novo começo e ele costumava deixar tudo organizado, seus passos eram pré determinado com dias de antecedência. Mas sempre imaginava os acasos, estas pequenas situações encaixadas ao que é pré determinado, como um erro, um engano, uma nova situação que faziam seus dias serem diferente. Seu modo de vida era acelerado e proporcionava uma sensação de se sentir preenchido. Trabalho prazeroso é o que todo mundo precisa para ser feliz, era simples, pensava Keanu. Como todo inicio de dia ele sente o vazio que existe em seu peito, sempre se prolonga mais até o final do dia, é um sentimento destes que não se explica se sente mesmo estando feliz e estando tudo bem. Keanu prefere ignorar e não pensar, porque é melhor do que buscar respostas ou remédio.

- Vestiu uma calça Jens, um tênis, uma camiseta e uma jaqueta de lã e pegou as chaves do carro. Foi até a cozinha e a mulher que limpa a casa uma colombiana de uns cinqüenta e poucos anos, baixinha, morena e sorridente o recebeu na cozinha com um café pronto.
-Bom dia Maria, não precisa se preocupar sou acostumado a fazer minhas próprias refeições!
- As vezes não faz mal! Falou Maria sem sorrir mais muito solicita e carinhosa.
Ela ali na minha frente servindo meu café parece destas mães tradicionais de verdade, e sorrio para mulher e aceito o seu carinho, não sou acostumado a isto mas não iria decepcioná-la, não sou de lamentar pelo o que não tenho, não tive e não faa falta e Maria não esta em minha casa todos a dias.

.Do outro lado da cidade......

Começo meu dia de forma tranqüila e vou até a sala do diretor da ONG onde comecei como voluntária no bairro de Watts há 15 dias. Segui o corredor escuro e sujo, não há lixo, é só um prédio velho , descascado, gasto e sem manutenção há pelo menos 40 anos. Entro na sala de Steve e o homem negro, magro, alto e de cabelos brancos com um óculos na ponta do nariz fez sinal para que eu sentasse na única cadeira e que estava quebrada, procuro o melhor modo de me sentir segura e volto minha atenção para Steve

. Quando cheguei era desolador tudo o que tinha que ser feito, o abrigo conseguiu este velho prédio para servir de sede por dois anos gratuitamente. A ONG está sendo erguida com a força de Steve que abre e coloca em andamento muitos abrigos por diversos estados e cidades americana.

Há um mês cheguei a Los Angeles para aperfeiçoar o inglês e estudar edição de vídeo e fotografia. No Brasil sou uma profissional free lancer em produtoras de comerciais e eventos de campanhas políticas.. Cheguei aqui com a ajuda e apoio de meu tio Fred pastor da igreja que veio para os Estados Unidos e a Los Angeles para ajudar a desenvolver os projetos sociais da sua igreja. Eles tem há muitos anos trabalhos com drogas e crianças e tio Fred me convidou para trabalhar com crianças, pelo período de 1 ano, que foi o tempo máximo que eles conseguiram visto para a minha permanência. Como me programei para estudar e trabalhar na Ong, me disponibilizei como voluntária por meio período durante a semana, com finais de semana livres.

Estou me sentindo num turbilhão de emoções entre alegrias de coisas que já eram esperadas e as novidades. Já estamos em ritmo de trabalho porém Me sinto como uma turista com muitas coisas a serem descobertas e lugares a serem visitados como se eu fosse ficar aqui em férias por um longo período. Este sentimento já me fez esquecer meus dias monótonos no Brasil. Eu não sou acostumada a sair ou ter grupos de amigos e não namoro deste o final do meu casamento há quatro anos atrás. O que costumava fazer as vezes era sair com Cezar, um ator de teatro que quando estava sozinho ligava fazendo alguma convite para sairmos.
O vazio que sinto constantemente no peito se dissipou um pouco. È um vazio constante que sei a causa, mas não me interessa mudar esta situação.
Steve estava de costas para mim pegando um monte de papéis num balcão velho e se voltou enquanto e jogava o enorme monte de notas sobre a mesa e sentou na cadeira de frente e apontou os volumes dizendo:

-Tudo isto são contas a pagar de alimentos, materiais e cobertores, fora os móveis, como camas, cadeiras, mesas, carteiras, uma cantina completa para atender no máximo 200 crianças. Steve cruza as mãos sobre as notas e me olha com aparente calma.

_Livia eu e seu tio, temos uns contatos por aqui, onde estamos arrecadando alguns fundos e precisamos pintar o prédio, montar os quartos, as salas de aulas com móveis e conseguimos uma significativa quantia que vai dar para fazer tudo, quem vai doar é um ator e ele pediu que pegássemos a doação com ele que não quer cerimonial ou vir até aqui em comitiva, para chamar a atenção da mídia.
Concordo e falo a ele - é destes doadores que precisamos e não de pessoas que usam doação para auto promoção e depois desaparecem, como é de praxe.

- O encontro será ás 17:00 neste restaurante no centro, falou Steve e entregou me o endereço escrito num papel e sai da sala administrativa.
Ainda é cedo até as 17;00 hs posso fazer muito trabalho ainda, vou me juntar aos meninos e ajudar a carregar os materiais da reforma.

O material que carregavamos era para começarem as reformas nas paredes descascadas e rachadas, chão com buracos, forros com pedaços faltando, rachaduras em todos os cômodos, parecia que aquele lugar seria impossível de ficar em estado habitável e saudável para crianças em apenas 20 dias como prometeu Steve, depois que eu trouxer a doação do dia.
Ainda não tenho idéia de tudo o que tem por vir, mas vendo a força e a garra de todos eu me pergunto como um país tão rico pode ter tantos problemas com drogas e abandono!

Terminamos de carregar e Samy uma japonesa encantadora com seus olhinhos puxados e sorriso tímido me convidou para irmos tomar um café numa cafeteria na frente da Ong. Saímos do prédio e atravessamos a rua andando uns 20 metros até a cafeteria onde sentei de frente para ela e pedi só um café, pois vou jantar mais tarde e Sammy pediu um lanche e começou a conversar.
- Lívia todas as brasileiras são como você? Assim tão donas de si mesma?
Acho graça do jeito e da pergunta de Sammy e respondo no meu inglês ainda lento, pensando nas palavras.
Sammy não vou procurar o que não sei se quero! Vai que eu procuro algo e caio em situações que depois viram um problema?
-- Como assim? Questionou Sammy.
- Sammy aquelas situações que você fica com alguém e depois só uma das partes quer continuar na história. Fica aquela choradeira, tentando manter o que um não quer, é um incomodo, já passei por isso e não gosto, não quero ser chata para ninguém e não quero que ninguém seja chato comigo.
- Sammy sorriu e concordou.

Terminamos o café e seguimos até o metrô e caminho pensando em minha vida, meus problemas com meus relacionamentos que me deixam distante do assunto. Mas não vou ficar rezando minha vida e meus problemas com as pessoas, basta a família saber..
Para Samy e para os amigos eu sou livre de amarras e relacionamentos, compromissos ou obrigações profissionais, mas sou muito envolvida com proteção familiar, porque vim de uma família muito unida, onde todos se preocupam com todos, se ligam, se falam, brigam e se reconciliam, e todos estão muito felizes que vim viver esta experiência aqui nos estados Unidos.

Desço do metrô e sigo para o apartamento, moro no centro de Los Angeles, a 20 minutos da Universal Studios e a 10 minutos do Echo Park, em um simples apartamento para solteiro e de fácil acesso a qualquer parte do condado via transporte público, é fácil e barato ter carro aqui nos EUA, mas em Los Angeles não achei muito importante ou confortável, pois os estacionamentos fechados são caros (no centro e em Hollywood custa até 30 dólares a noite), os que cobram por hora. As vagas de rua (quando se acha) tem limite de tempo, as vezes de uma hora, as vezes de duas, então tem que ficar voltando para colocar mais dinheiro no parquímetro. Para quem mora no centro e trabalha no bairro Watts e adora passear nos finais de semana por todo o condado de Los Angeles, optei por não ter carro, seria um problema a menos para me preocupar..

Cheguei no apartamento que aluguei com os móveis novos mas com aspecto de um ambiente antigo por terem entalhes e serem em madeira envernizada. Foi barato para os preços americanos, mais é muito bonitinho e confortável, com uma cozinha pequena de paredes brancas e móveis em madeira maciça, sala e um quarto com móveis também em madeira maciça, Na sala contém dois sofás antigos com estofamento em veludo vermelho e duas poltronas também com estofado vermelho e duas mesinhas, na decoração procurei dar um ar mais jovial e moderno com duas luminárias e um tapete verde e ainda TV, som, objetos e gravuras de Roy Lichtenstein que são bem coloridos e atuais tirando a austeridade do ambiente. O quarto é de paredes brancas e cortinas verdes oliva, uma cama com entalhes na cabeceira roupas de cama também em verde, e um cobertor vermelho que fica dobrado aos pés. Uma cômoda com alguns objetos e velas vermelhas para criar uma iluminação indireta e perfumada, tem ainda uma cadeira poltrona antiga com pés e encosto entalhados e estofado em verde e um tapete vermelho. Os dois ambientes se complementam em madeira verniz, verde e vermelho.
Tomei um banho e vesti uma calça Jens escura, uma bota salto médio, uma camiseta meia manga branca e uma jaqueta preta de lã que vai até o quadril e jogo um cachecol azul claro, deixando os cabelos soltos.

Fico pensando como deve ser uma celebridade e vou até um ponto de ônibus onde um já está encostando, embarco e meu celular toca e é tio Fred me informando que Keanu Reeves já está me esperando. Chego em poucos minutos na sexta estação e desço na esquina do restaurante e entro devagar.